terça-feira, 11 de outubro de 2016

Apresentação

Coletivo feminista classista “Rosas de Outubro”


Em 2016, depois da repercussão do caso do estupro coletivo cometido contra uma adolescente de 16 anos na Zona Oeste do Rio de Janeiro, milhares de mulheres e homens se empenharam em debater a cultura do estupro colocada em nossa sociedade.
Não deixaram de aparecer também comentários machistas e deturpados desse crime, onde o próprio delegado constrangeu a garota com comentários misóginos* e foi afastado das investigações. *Misógino é um termo utilizado para se tratar do desprezo ou ódio às mulheres, diretamente relacionado com a violência contra a mulher.
Esse tipo de atitude, de culpar as vítimas pelas violências que sofrem, é naturalizada pela sociedade que tenta mascarar a verdadeira face do machismo, como se homens fossem estupradores em potencial que não conseguissem controlar seus impulsos mais sórdidos, e as mulheres devessem ser responsabilizadas por isso.
As roupas que usam ou os locais que frequentam jamais deveriam ser associados a casos de violências como estes. Para se pensar de maneira bem simplista, recorreríamos ao rebatimento que, mesmo as mulheres que andam de burcas e normalmente acompanhadas, são também vítimas de estupros. As sociedades islâmicas, por exemplo, têm o maior índice de estupro do mundo. Como se não bastasse, essas mulheres ainda são criminalizadas pelas próprias violências e opressões que sofrem.
Os estupros, opressões, “cantadas” e objetificação do corpo da mulher têm a ver com MACHISMO. Historicamente mulheres são inferiorizadas, e a divisão sexual opressora surge com mais força através da propriedade privada, “justificada” pela questão da herança dos filhos, onde as mulheres foram “cercadas” e marcadas junto às propriedades e deveriam ser fiéis, obedientes e dominadas, enquanto os homens só tinham o comprometimento da manutenção familiar, mas sua sexualidade sempre pôde ser exercida livremente e como símbolo de sua “masculinidade”.
O capitalismo soube se apropriar muito bem dessa ideologia, reforçando a divisão sexual para poder tirar suas vantagens: primeiro, com a mulher servindo a seus propósitos de reprodução da classe trabalhadora, onde elas mantinham a casa organizada, os filhos “bem cuidados” e o marido satisfeito. Depois, quando viu na mulher mais uma oportunidade de lucrar, incentivou sua inserção no mercado de trabalho com salários mais baixos, vistos apenas como “complementar” à renda do homem, em postos precarizados e bastantes definidos para “serviços femininos” (como espaços de cuidados, setores alimentícios, de educação e vestimentas).
Mesmo que essa realidade vêm se modificando, pela própria luta das mulheres, é necessário entendermos que, para uma mudança real, toda a estrutura social precisa ser modificada. Por isso entendemos a urgência em se fazer o recorte de classe, raça/etnia e sexualidade. O feminismo, para além da luta por direitos pontuais, necessita ser classista, combativo e se colocar em conjunto às bandeiras de uma nova ordem social.
O feminismo classista não se limita à igualdade teórica entre os sexos, mas pela liberdade das mulheres com o fim da propriedade privada e a divisão sexual do trabalho. O sistema capitalista é essencialmente patriarcal, onde os homens têm o domínio moral, social e político sobre as mulheres, e precisa ser derrubado para derrotar as contradições existentes.
Nós, mulheres lutadoras, vemos a necessidade de diferenciar as condições das trabalhadoras e burguesas, e as particularidades das mesmas dentro da própria classe; na visão coletiva contra o individualismo, idealismo, pós-moderno e liberal. Precisamos agregar bandeiras contra o racismo, a LGBTfobia, xenofobia e demais preconceitos e opressões, contra o capitalismo e as limitações dos movimentos reformistas.
As mulheres trabalhadoras são as que mais sofrem com os abusos sexuais e morais no trabalho, com trabalhos mais degradantes e precários com os menores salários, com a falta de creches públicas e em horários que atendam suas demandas, perdem sua infância e juventude cuidando de casa e filhos, são acometidas pela violência doméstica, pelos relacionamentos abusivos em razão de dependência, não conseguem se divorciar de maridos violentos, têm sua autoestima afetada pela imposição estética e midiática, não têm políticas de lavanderias públicas e são criminalizadas pelo aborto – práticas que, gostando ou não, ocorrem e matam milhares de mulheres todos os anos, sendo assim, uma necessidade de saúde pública e não de imposição pelas religiões. Esse quadro se agrava quando a mulher é negra, de periferia, travesti, transgênero, transexual ou indígena.
Com essa reflexão inicial, nós, mulheres francanas, trabalhadoras e estudantes, queremos construir um movimento feminista de classe – que pense e atue sobre necessidades básicas, direitos sociais e políticas públicas, mas na perspectiva de desconstrução social e construção de uma nova ordem societária com o fim do capitalismo que nos oprime, segrega, coloca umas contra as outras, mata, corrompe, nos põe como objetos, assedia e aprisiona.

Se não for colocado o antagonismo de classes, atacaremos minimamente os sintomas e não as causas das opressões, e a única saída é a construção de uma sociedade sem classes – socialista. Convidamos todas àquelas interessadas em se organizar por demandas que não são minhas, mas são nossas, de todas e todos, e internacionais, a se juntarem nessa luta.